Na Política Habitacional, percebemos que a discriminação e a segregação começam na escolha da área a ser desapropriada para a implantação do loteamento. Fica sempre em uma região geográfica menos valorizada da cidade. Muitas das vezes relacionada ao patrocinador da campanha eleitoral de algum político.
Essas áreas ficam distantes de todos os equipamentos sociais: escolas, creches, postos de saúde, supermercados, farmácias, postos policiais. E longe do setor empregatício. E para favorecer economicamente alguém – muitas vezes do ramo imobiliário – uma área ociosa entremeia o novo loteamento e o setor urbanizado da cidade.
Outros tormentos para o pretendente à casa própria são os re(es)quisitos para se ter direito a entrar na fila, fazer a inscrição e ficar na lista de espera até serem chamados.
O passo seguinte é um interrogatório, se derem “sorte” recebem uma lista com várias tarefas, uma verdadeira maratona:
- comprovação de vida conjugal e de preferência que tenha filhos, e quanto mais, “melhor”;
- comprovação que mora no município há mais de cinco anos e que são eleitores no município;
- apresentação de certidão cartorial que não possuem bens imóveis; e
- cópia de todos os documentos pessoais.
Agora, é só pegar as chaves da casa? Naaão! O pretendente que faltou várias vezes do trabalho para correr atrás da documentação exigida, passou por várias humilhações, acumulou prejuízos como dias de serviço cortados, perda da cesta básica de alimentos, gasto com transporte e telefonemas. Só Deus sabe quantas vezes terá de voltar ao balcão da companhia habitacional em busca de informações sobre o andamento do processo de seleção daqueles que irão compor a lista enviada à Caixa Econômica Federal.
A maioria, mesmo depois de passar por todo o sacrifício, fica de fora. A documentação não terá serventia para o próximo lançamento habitacional.
Definidas as áreas dos loteamentos, a segregação torna-se mais clara, com o critério da renda familiar. Separam-se as famílias por faixas salariais: 500 casas em tal área para quem tem renda familiar de até três Salários Mínimos; 500 casas no outro conjunto para famílias que ganham de quatro e a sete Salários Mínimos.
Para as famílias que ganham acima de sete Salários Mínimos, constroem condomínios fechados.
Os conjuntos ficam estigmatizados com a separação de pobres, classe média e o setor nobre onde moram os ricos.
Com isso, as conseqüências econômico-sócio-culturais vão se agravando gradativamente. As referências para os filhos da classe trabalhadora ficam frágeis. Ficam praticamente sem a oportunidade de relacionar, de interagir com crianças de outras classes sociais. O vocabulário não enriquece.
Os desejos, os sonhos de serem pessoas cultas ou profissionais renomados e bem sucedidos demoram mais a se aflorarem. A convivência em sociedade amplia os horizontes. A diversidade de opções torna a pessoa – no caso a criança e o adolescente – mais exigentes no processo de escolha de brinquedos, da escola que vai estudar, da roupa que vai comprar, do corte de cabelo e do cabeleireiro, de locais de diversões.
Além das coisas materiais, a troca de conhecimentos e informações para o enriquecimento intelectual é fundamental na formação cidadã.
Como não há possibilidade de tirar de onde não tem, em uma comunidade com escassos recursos financeiros as chances de desenvolvimento compatível com as demandas em todos os níveis nos diais atuais, tornam-se impossíveis.
Está faltando heterogeneidade de classes sociais nas implantações dos núcleos habitacionais.
A falta de sensibilidade e o descaso com os vários segmentos da sociedade nas políticas públicas oficiais é algo vergonhoso no Brasil. Quando elas acontecem não são integradas, são por área: educação, saúde, esporte e lazer, habitação, emprego, etc. ou por segmento social: pessoas com deficiência, idosos, mulheres, negros.
Os políticos precisam olhar e enxergar a sociedade brasileira como um todo, não fracionada igual uma vaca no açougue, que é conhecida por partes, separadamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário